bissoumeemi, a orelha esquerda

Tio Alfredo é o irmão mais velho de minha avó, Noemia. Negro e com poucos cabelos crespos cinza claros. É altivo, apesar de carregar o fardo de 83 anos nas costas, trabalhava na terra, com força bruta. O homem e seu ambiente. O sol desferiu vários raios, fazendo brotar de sua epiderme infinitas manchinhas; algumas escuras outras atingindo até a brancura total, parecia um mosaico. Sempre nas festas de família, ele estava lá. Todo parente que chegava e prontamente se levantava e estendia a mão. O aperto era firme, mostrando que ainda tinha muita força e disposição. Até chegava a incomodar os mais jovens. Logo após o aperto, ainda segurando sua mão, trazia-me para mais perto me dando um abraço. Duro e cheio de espaço. E lá ia ele dar três tapões que ressoavam dentro de mim como um terremoto.

-Deus te abençoe, meu filho. Em nome do pai, do filho e do... – ele se afastava, mais ainda me segurando pelos braços. E olhando para o meu fundo. Os seus olhos eram velhos, mal podia se ver dentre as rugas e as peles caídas. Era de certo em sua juventude um castanho bruto escuro, mas devido a catarata, as bordas tinham ficado de um azul celeste, muito bonito de se ver. A terra se misturando com o céu.

- Eu já li a Bíblia trinta e três vezes, caminhado com os passos da cristandade, a união dos povos e a Santíssima Trindade. Louvado seja o nosso senhor Jesus Cristo! Amém. O excelso se chega pela iluminação. E olhava para o céu e ria.

Às vezes haviam estórias engraçadas sobre o Tio Alfredo. Ele tinha acordado na madrugada; estava gritando como se estivesse em uma guerra de cueca branca e fralda geriátrica. Com a maior seriedade do mundo defendendo suas posses. Também gostava de fazer longas caminhas para pensar na vida e ter reflexões sobre suas leituras bíblicas, cada vez mais detalhistas. Sempre que o via na rua andando com seu guarda chuva preto, calça social e camisa de botão, e para proteger do sol escaldante um chapéu marrom claro.

No começo parecia me estranhar, chegava bem perto os ouvidos para ver se poderia identificar a voz.

-Quer uma carona, tio?

- Não meu filho, não tem necessidade, to aqui matutando sobre as escritas. Vai com Deus. – e acenava enquanto fica pequeno no retrovisor.

Comments

gduvivier said…
muito bonito.

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